quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

ONU proclama 2011 como Ano Internacional para Afro-Descendentes

Em mensagem à Assembleia-Geral, Ban Ki-moon diz que o evento pretende reforçar o compromisso político para erradicar a discriminação.

As Nações Unidas lançaram, nesta sexta-feira em Nova York, o Ano Internacional para Descendentes de Africanos.

Erradicar a discriminação

Num discurso, o Secretário-Geral, Ban Ki-moon explicou o objetivo do evento, que será marcado em 2011.

Diversidade

Segundo ele, o Ano Internacional tentará fortalecer o compromisso político de erradicar a discriminação a descendentes de africanos. A iniciativa também quer promover o respeito à diversidade e herança culturais.
Numa entrevista à Rádio ONU, de Cabo Verde, antes do lançamento, o historiador guineense Leopoldo Amado, falou sobre a importância de se conhecer as origens africanas ao comentar o trabalho feito com quilombolas no Brasil.

Dimensão

"Esses novos quilombolas têm efetivamente o objetivo primordial de fortalecer linhas de contato. No fundo restituir-se. Restituir linhas de contatos, restituir aquilo que foi de alguma forma quebrada, aquilo que foi de alguma forma confiscada dos africanos, que é a possibilidade de restabelecer a ligação natural entre aqueles que residem em África, que continuam a residir em África e a dimensão diaspórica deste mesmo resgate. A dimensão diaspórica da África é efetivamente larga e grande", disse.
Ban lembrou que pessoas de origem africana estão entre as que mais sofrem com o racismo, além de ter negados seus direitos básicos à saúde de qualidade e educação.

Declaração de Durban

A comunidade internacional já afirmou que o tráfico transatlântico de escravos foi uma tragédia apavorante não apenas por causa das barbáries cometidas, mas pelo desrespeito à humanidade.

O Secretário-Geral finalizou a mensagem sobre o Ano Internacional para os Descendentes de Africanos, lembrando a Declaração de Durban e o Programa de Ação que pede a governos para assegurar a integração total de afro-descedentes em todos os aspectos da sociedade.

FONTE: Site da ONU - Mônica Villela Grayley, da Rádio ONU em Nova Iorque. 10/12/2010

sábado, 18 de dezembro de 2010

Ensaísta brasileira emociona o Senegal

Ícone da literatura afro-brasileira, a escritora e ensaísta Conceição Evaristo foi uma das convidadas pela Fundação Cultural Palmares para participar da programação cultural do Brasil no III Festival Mundial de Artes Negras, no Senegal. Entre os 60 países convidados, o Brasil é o país homenageado e tem a maior delegação, com 362 personalidades, entre artistas, grupos culturais, intelectuais e cineastas.


Fotos: Elaine Hazin
Conceição Evaristo na Ilha de Gorée, ao lado da estatua que simboliza o fim da escravatura

Com o tema "Da representação à auto-apresentação do negro na literatura brasileira", a escritora integrou a programação de pensadores do Festival sobre a questão da diáspora africana. Em Gorée, Conceição reuniu intelectuais de países africanos. Emocionada afirmou que a experiência trouxe uma sensação "de volta à origem [...]. Não uma origem particular, mas de uma dor coletiva. Essa recordação, como um ato voluntário de resistência, nos faz acreditar que somos fortes e por isso recuperamos a vida".

Conceição Evaristo é Mestre em Literatura Brasileira pela PUC Rio, e Doutoranda em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Autora dos romances Ponciá Vicêncio, 2003 e Becos da Memória, 2006, Mazza Edições, a escritora lançou em 2008 a antologia Poemas da Recordação e outros Movimentos, Editora Nandyala, obra classificada entre os 50 finalistas do Prêmio Portugal Telecom, no ano de 2009.

Fonte: http://www.palmares.gov.br/003/00301009.jsp?ttCD_CHAVE=3104

III Festival de Artes Negras em Dakar - Senegal



Na origem, o primeiro Festival Mundial das Artes Negras organizado em Abril de 1966 devia finalizar, do ponto de vista do Presidente e poeta Léopold Sédar Senghor, o seu iniciador, a marcha de um século que celebrou com fasto as culturas negras.
Para Senghor como para Césaire, os pais da Negritude, a organização do Festival tinha a ver tanto com a política como com a cultura. Devia servir a reafirmar a nobreza das culturas africanas, a celebrar a sua essência e a sua importância, num contexto em que a África mal acabava de sair da colonização e os Estados – Unidos tinham dificuldade para pôr fim à Segregação racial.

Consoante os princípios gerais do primeiro Festival, tinha como objetivo principal «permitir ao maior número possível de artistas negros, ou de origem negra, fazer-se se conhecer e amar por um auditório tão vasto como possível num clima de tolerância, de estima mútua e desenvolvimento intelectual.»

As delegações africanas afluíram, portanto, com as estrelas da diáspora da época, entre as quais Duke Ellington, Arthur Mitchell e Alvin Ailey (American Negro Dance Company), Mestre Pastrinha (grande capoeirista da Bahia), Marion Williams ou ainda Clementina de Jesus, rainha do samba.

Após Dakar, Lagos acolheu em 1977 o segundo Festival Mundial das Artes Negras. Esta edição inscrevia-se no mesmo espírito de defesa e ilustração das civilizações e culturas negras.

Fonte: http://www.dc.mre.gov.br/festivais-e-concursos/dacar-2013-iii-festival-mundial-de-artes-negras

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Zumbi e o Quilombo dos Palmares

Zumbi dos Palmares, elevado ao panteão dos heróis da nação brasileira, é o símbolo da resistência contra a exploração do homem branco, nunca se deixou dobrar diante das injustiças do sistema escravista. Hoje, Zumbi dos Palmares, é o grande ícone e testemunho de que negros e negras nunca deixaram de lutar, no passado, contra a escravidão e, na atualidade, contra o racismo e a discriminação racial nas diversas organizações do movimento negro por justiça, por direitos e por liberdade.

Zumbi dos Palmares

A grande preocupação de Zumbi ao fugir da opressão escravista, representada na figura do padre Melo, de quem era coroinha, era libertar-se para libertar. Esta é a palavra-chave que pode caracterizar a vida desse grande herói da liberdade e da causa dos afro-brasileiros

Zumbi e outros negros e negras como Ganga Zumba, Aquatume, Dandara construíram no Brasil, na região da Serra da Barriga, no atual Estado de Alagoas, um pedaço da África, o Quilombo dos Palmares, que se constituiu numa sociedade totalmente diferente da dos brancos proprietários de terras e escravocratas. Nesta nova sociedade, a terra era da coletividade e tudo o que era nela produzido era dividido entre todos. O trabalho era feito por todos, no sistema de mutirão, bem na forma tradicional africana. Palmares constituía uma nova sociedade com uma variedade de culturas agrícolas, onde a produção visava o consumo interno e em alguns momentos a produção excedente era comercializada com as cidades vizinhas. Na sociedade palmarina, governada inicialmente por Ganga Zumba e depois por Zumbi não havia divisão de classes (como era a sociedade colonial dos brancos), nem desníveis sociais, embora houvesse privilégios concedidos aos chefes militares e políticos. O quilombo dos Palmares e os diversos quilombos que existiram em praticamente todos os Estados brasileiros, representavam a única possibilidade, fora da morte, para fugir da escravidão e a tentativa de estabelecer uma comunidade negra, autônoma e livre. O Quilombo dos Palmares era, portanto, um lugar de liberdade, felicidade e justiça.

A ousadia dos negros em Palmares incomodou tanto as autoridades portuguesas da época, que ele foi destruído pelo bandeirante e capitão-do-mato Domingos Jorge Velho, que assassinou Zumbi em 20 de novembro de 1695 e capturou outros negros, fazendo-os retornar à escravidão.

Localização do Quilombo dos Palmares

Mesmo com a destruição de Palmares, a morte de Zumbi e a repressão aos diversos quilombos espalhados pelo Brasil colonial, os negros não deixaram de fugir, lutar e se organizarem pela contra a escravidão e a opressão. Os quilombos foram importantes na luta contra a escravidão, tendo se torna num elemento dos mais importantes no desgaste permanente, quer social, econômico e militar, no processo de substituição do trabalho escravo pelo assalariado e no próprio processo de abolição da escravidão.

• Para as autoridades portuguesa quilombo era “toda habitação de negros fugidos que passam de cinco, em parte despovoada ainda que não tenham ranchos levantados, nem se achem pilões neles”. (02 de dezembro de 1740)
• A palavra Kilombo, do verbo kulomboloka, na língua Kibundo de Angola, significa dispersar-se, fugir a procura de um refúgio sobre a proteção de alguém; o seu plural é ilombo.
• O Quilombo (Kilombo) seria uma espécie de zona franca, de território livre que o escravo fugitivo construía e governava segundo as tradições ancestrais africanas.
• Pode-se verificar a presença dos quilombos em diversas regiões da América: os bush Negrões (Suriname), os Palemques (Guatemala, Peru, Colômbia).

História do Dia Nacional da Consciência Negra

Uma história de subversivos que não se imaginavam como tal

Eles fugiam de complicações com autoridades. Ainda assim, desbancaram o 13 de maio.

Em São Paulo, no Rio e em outras 222 cidades do País comemora-se amanhã o Dia da Consciência Negra. É um feriado recente do ponto de vista oficial e de significado desconhecido para a maioria das pessoas. A história não oficial, porém, é longa e recheada de surpresas. Uma delas é que o berço do feriado que desbancou o dia 13 de Maio foi o Rio Grande do Sul - Estado quase sempre apresentado como terra de gente branca e loira, descendente de alemães e italianos. Outra surpresa: trata-se de uma história de subversivos que não se imaginavam subversivos e que agiam em plena ditadura militar


O ano de 1971, marco zero do Dia da Consciência Negra, foi um dos mais pesados dos anos de chumbo. O general Emilio Garrastazu Médici, por acaso um gaúcho, mandava e desmandava no País e o tempo andava tão fechado que, ao saber que em Porto Alegre um grupo de negros se reunia para discutir a história de Zumbi dos Palmares, o serviço de inteligência do Exército mandou ver o que era. Quis saber se tinha ligação com a Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, ou VAR-Palmares, movimento guerrilheiro que acabou desmantelado naquele ano.

Foram os tais negros - que não tinham nada a ver com a organização clandestina e fugiam de complicações com as autoridades - os idealizadores do feriado de amanhã. Não chegavam a uma dúzia, entre universitários e jovens recém-formados, e se reuniam na Rua da Praia, oficialmente Rua dos Andradas, na época festejada área de circulação de negros, no centro de Porto Alegre.
Paravam diante do prédio da Casa Masson, revendedora de jóias e relógios, hoje ocupado por uma filial das Casas Bahia, e lá ficavam, trocando figurinhas sobre namoros, filmes, clubes de futebol e política. Um dos mais assíduos e animados era o poeta e professor Oliveira Ferreira da Silveira.
Ele conta que, apesar da sombra da ditadura, o debate sobre as grandes questões nacionais fervia e refervia. Foi por aqueles anos, um pouco mais à frente ou para trás, que ele ouviu, em debates na PUC de Porto Alegre, as vozes de personalidades como o pensador católico Alceu Amoroso Lima e os sociólogos Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni e Florestan Fernandes.

Oliveira fala baixo e pausado e, fora os cabelos brancos, não aparenta a idade de 65 anos. Dono de memória admirável, dessas que permitem ao dono derramar versos e versos no meio de uma conversa, dos mais diferentes autores negros, do cubano Nicolás Guillén ao brasileiro Solano Trindade, sem esforço nenhum, como se fosse uma respirada mais longa, ele guarda com riqueza de detalhes os fatos da época. Recorda que às vésperas do Dia da Abolição, o 13 de Maio de 1971, o grupo enveredou para uma discussão animadíssima sobre o significado daquela data. Ou falta de significado, pois ali era unânime que os negros não tinham o que comemorar. Afinal, eram vítimas de discriminação em qualquer lugar do País.

O mais exaltado era Jorge Antonio dos Santos, o Jorge de Xangô, que fazia teatro e era uma espécie de animador cultural na comunidade negra. Mas os outros não ficavam atrás. Dois anos antes, Silveira escrevera um poema, depois publicado em livro, no qual dizia: "13 de maio traição/ liberdade sem asas/ e fome sem pão."

Na semana passada, conversando com o repórter nas imediações da Rua dos Andradas, entre as passagens suspensas e os arcos do grandioso Hotel Majestic, hoje transformado no Centro Cultural Mário Quintana, numa homenagem ao poeta que lá viveu durante anos, o professor explicou: "Nós negros éramos instados a comemorar o 13 de Maio como nossa grande data. Mas não havia motivo para comemorar. A Lei Áurea aboliu a escravidão, mas não adotou providências para absorver socialmente a grande massa de escravos. Não se fez nenhum movimento para dar terras a essa população. Pelo contrário, eles foram buscar mais migrantes europeus, num esforço de embranquecimento do País."

E então criou-se a dúvida: se não era 13 de Maio, o que seria? Na discussão alguém apareceu com um fascículo da série Grandes Personagens da Nossa História, lançada no final dos anos 60 pela Abril Cultural.

Era o fascículo sobre Zumbi, líder dos quilombos de Palmares e símbolo maior da resistência negra ao escravismo. Lá estava registrado que o assassinato do guerreiro ocorrera no dia 20 de novembro de 1695, em meio ao ataque da última das expedições enviadas para aniquilar o reduto negro formado por quase dez quilombos, na então capitania de Pernambuco.

Foi o estopim. E se fosse comemorado o 20 novembro? Se, em vez da bondosa princesa, o negro insurgente?

O grupo saiu à caça de livros históricos para reunir mais informações sobre o episódio e, principalmente, confirmar se a data da morte estava correta. Uma fonte valorosa foi um livro que Silveira mantém até hoje em sua estante: As Guerras nos Palmares - Dados Sobre a Campanha - Domingos Jorge Velho e a Tróia Negra. Escrito por Ernesto Ennes e publicado na década de 30, era uma obra rica em documentos oficiais, que confirmaram o 20 de novembro. A ironia é que o objetivo de Ennes não foi o de ajudar os negros, mas exaltar os bandeirantes que comandaram as expedições de extermínio.

Entusiasmada com seus achados, a rapaziada decidiu formar um grupo de estudos. Silveira estava entre os quatro que toparam a empreitada. Formado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com especialização na língua francesa, ele dava aulas em escolas da rede pública e achava que estava em falta com a militância do movimento negro desde a leitura, anos antes, do livro Reflexões Sobre o Racismo, de Jean Paul Sartre. "Eu estava atrasado", conta o professor, cujo pai era branco e uruguaio e a mãe, negra e nascida numa comunidade rural de Rosário do Sul, no centro-oeste do Estado.

O segundo integrante do grupo de estudos era Antônio Carlos Cortes, estudante de Direito que ouvira muito sobre racismo em casa por causa do pai, que, embora tivesse boa formação educacional e falasse inglês, nunca conseguiu ir além do cargo de contínuo numa repartição pública. Ainda faziam parte do grupo Ilmo Silva, estudante de Economia, que cursara o ginásio numa escola particular onde era o único negro; e Vilmar Nunes, estudante de Administração e funcionário público.

Em 20 de julho de 1971 os quatro oficializaram a formação do Grupo Palmares e acertaram a realização de três atividades públicas. As duas primeiras foram homenagens a Luiz Gama e José do Patrocínio, negros e precursores da luta abolicionista.

A terceira e mais importante foi programada para 20 de novembro. Seria no Clube Náutico Marcílio Dias - que não tinha nada de náutico, mas era um dos mais animados dos quase dez clubes de negros que funcionavam em Porto Alegre.

Alguns desses clubes tinham se constituído como grupos de ajuda. Entre outras coisas providenciavam enterros dignos para os mais pobres. Outros eram clubes sociais, para bailes e blocos carnavalescos, necessários numa cidade onde os clubes de brancos recusavam pessoas de pele negra.
No fundo, eram espaços de resistência contra a discriminação. O mais antigo, o Sociedade Beneficente e Cultural Floresta Aurora, criado em 1872, antes da Lei Áurea, funciona até hoje.

E aqui vale um parêntese para dizer que a importância desses clubes no Estado já foi tão grande que a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) decidiu escolhê-lo para abrigar o 1.º Encontro Nacional de Clubes Negros, previsto para o próximo fim de semana em Santa Maria, no centro do Estado.

Voltando a 1971: dias antes do encontro do 20 de novembro, um jornal porto-alegrense anunciou que seria uma homenagem dos "negros do teatro" a Zumbi. Não deu outra: no dia seguinte, um agente da Polícia Federal bateu no clube e advertiu que, se fosse teatro, era preciso submeter o texto à censura prévia.

"Para não causar complicação, escrevemos um roteiro da apresentação que faríamos sobre Zumbi e levamos até a PF", conta Silveira. "Leram, aprovaram e aplicaram o carimbo, sem o qual não se podia fazer nenhuma exibição. Guardo a página carimbada até hoje."

Receoso, o grupo adotou o mesmo procedimento em todos os eventos que promoveu a partir dali: escrevia o roteiro e saía atrás do carimbo da PF. "O agente encarregado me recebia bem, com simpatia. Até nos cumprimentávamos na rua."

Na data marcada, um sábado à noite, apareceram 12 pessoas, somando aí os integrantes do Palmares. Ficaram reunidas durante duas horas no Náutico, que funcionava numa casa já demolida, na Avenida Praia de Belas, quase esquina com a José de Alencar. A maior parte do tempo foi tomada com uma apresentação sobre Zumbi e sua importância para o movimento negro. Foi um sucesso.

Ao fundo, sem se juntar ao grupo, um senhor branco assistiu em silêncio. Ao final foi se apresentar. Era o historiador gaúcho Décio Freitas, respeitado estudioso de insurgências populares, que se exilara no Uruguai após o golpe de 1964.

Recém-chegado do exílio e ainda temeroso de aparecer em público, ele fora até o Náutico para presentear o grupo com um livro que acabara de lançar em Montevidéu. Chamava-se La Guerrilla Negra e tinha Zumbi como tema.

No ano seguinte, o grupo, engrossado por novos associados, fez nova comemoração no 20 de novembro. Dessa vez ganhou um empurrão da Revista Zero Hora, que publicou um encarte de sete páginas chamando a atenção para a questão negra.

Em 1973, a programação foi mais extensa, com show musical, exposição de obras de artistas plásticos negros e uma palestra de Décio Freitas.

Aos poucos os eventos gaúchos atraíram a atenção da mídia nacional e de grupos negros de outros Estados, que também passaram a adotar o 20 de novembro. Finalmente, em 1978, o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial adotou a data, batizando-a de Dia Nacional da Consciência Negra. Mais recentemente os poderes públicos abraçaram a idéia, dando origem ao feriado de amanhã, celebrado principalmente em cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso. [...]

Publicado no O Estado de S.Paulo, Caderno Aliás, 19/11/06, pelo jornalista Roldão Arruda. Não incluímos aqui a parte final do texto.
* O professor e poeta Oliveira Silveira faleceu no dia 1/1/2009 na cidade Porto Alegre.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

O movimento da Negritude

A Negritude tem a sua origem nos movimentos culturais protagonizados por negros, brancos, mestiços que, desde as décadas de 10, 20, 30 (século XX), vinham lutando por renascimento negro. O principal objetivo do movimento da Negritude era a busca e a revalorização das raízes culturais africanas, crioulas e populares.

A ideia de renascimento, indigenismo e negrismo surge como consequência das luzes e do romantismo, que levaram à abolição da escravatura e finalmente à possibilidade de, após a Revolução Francesa de 1789, os povos supostamente poderem assumir a liberdade e igualdade.


Aimé Césaire (1913-2008)


O termo "Negritude" aparece pela primeira vez escrito por Aimé Césaire, em 1938, no seu livro de poemas, Caderno de um regresso ao país natal (Cahier d'un retour au pays natal); está intimamente associado ao trabalho reivindicativo de um grupo de estudantes africanos em Paris, nos princípios da década de 30, de que se destacam como principais responsáveis e dinamizadores Léopold Sédar Senghor (1906) senegalês, Aimé Césaire (1913), martinicano, e Leon Damas (1912), ganês. Estes autores da Negritude legaram-nos uma obra literária da máxima importância; mas foi Senghor que, com a Presidência do seu país (Senegal) e uma larga aceitação Ocidental (política literária e acadêmica) contribuiu decisivamente para a divulgação da Negritude.


Léopold Senghor (1906-2001)

É a Senghor que são atribuídas as primeiras tentativas de definição do conceito de Negritude: "Conjunto dos valores culturais do mundo negro”.
 
Eis alguns valores característicos do homem negro:
  • o homem negro é essencialmente religioso e cultural, ritual e celebrante, porque para ele existe um ente supremo, o "sagrado", que é o verdadeiro real
  • o homem negro é simbólico, porque o seu mundo é o mundo das imagens e do concreto; todas as realidades materiais, visíveis e imediatas são anunciadoras e portadoras de outras realidades
  • o homem negro é o homem de coração, porque, para além do corpo, da forca vital, da habilidade, do entendimento e de todas as outras qualidades humanas, é ainda pelo coração que o homem se define, que o homem vale e é julgado; para usar a categoria de um provérbio africano: "o coração do homem é o seu rei".

Importa revelar ainda que chegou mesmo a haver grandes figuras Ocidentais dizendo que a negritude era também um movimento racista. Mas isso não corresponde à verdade, porque se para Césaire a "Negritude", no início, se fez racista simplesmente para realçar os seus valores, a sua dignidade e afirmá-los, para Senghor era ainda algo mais do que isso: a "Negritude" é um humanismo, porque todas as raças tinham lugar neste universo civilizacional de inspiração do homem.

Léon Damas (1912-1978)

É de capital importância referir-se ainda que a "Negritude" não surgiu apenas com o objetivo da recuperação da dignidade e da personalidade do homem e da mulher africanos, mas também como um movimento que contribui para impulsionar o processo de descolonização do continente africano.

Texto de Nilton Garrido (SEUC Sec - Turma AS) encontrado em http://www.prof2000.pt/users/hjco/alternativas01/pag00009.htm (acesso em 10/09/10).
As imagens foram incluídas por nós no texto.


terça-feira, 26 de outubro de 2010

Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra



Saúde da população Negra é direito, é lei

Racismo e discriminação fazem mal à saúde.

Enfrentar o racismo, a discriminação racial e suas consequências na saúde; garantir a atenção às doenças e agravos que mais afetam a população negra e lutar pelo fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) são as principais bandeiras da Mobilização Nacional Pró-Saúde da População Negra.


Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra faz um alerta aos governos e à sociedade

Nesta quarta, 27 de outubro é o Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra. Em todo país, movimentos sociais negros organizados em parceria com gestores municipais e estaduais estarão promovendo rodas de conversa, seminários, caminhadas, encontros e atividades culturais com o propósito de sensibilizar a sociedade brasileira, chamar a atenção das autoridades e assegurar a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra nos estados e municípios.

A expectativa é a de que mais de 40 cidades participem da agenda de mobilização em todo Brasil em 2010. Para o dia 27, foram anunciadas atividades nas cidades de Porto Alegre, Passofundo, Bagé, Caraguatuba, Campinas, Araraquara, São Paulo, Salvador e Teresina, entre outras. A mobilização começou no dia 20 de outubro e segue até o dia 20 de novembro. Confira a programação nacional no mapa da mobilização abaixo.
Com o slogan “Saúde da População negra é direito, é lei – Racismo e discriminação fazem mal à saúde”, a campanha de mobilização pró-saúde da população negra 2010 foi criada para informar à população negra sobre os seus direitos e ampliar o debate com a sociedade em geral. Além disso, propõe informar sobre o racismo e suas implicações para as profundas desigualdades motivadas pelo quesito raça/cor que potencializam o processo de adoecimento e morte da população negra.

Racismo – De acordo com Fernanda Lopes, oficial nacional do Programa de Saúde Reprodutiva e Direitos do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), a construção da agenda de mobilização foi uma iniciativa de especialistas em saúde da população negra, do movimento de mulheres negras e do movimento negro.

“A idéia era provocar na sociedade o reconhecimento tanto por parte da sociedade quanto dos gestores de que o racismo faz mal à saúde e, além disso, descortinar a persistência das desigualdades raciais na saúde. Nesse contexto a intenção foi criar um ambiente favorável para a aprovação da Política Nacional de Saúde Integral à População Negra”, informa. A agenda de mobilização está no seu quinto ano de execução.

Este ano, a ONG Criola ocupa a Secretaria-Executiva da mobilização nacional pró-saúde da população negra. A realização é da Rede Nacional de Controle Social e Saúde da População Negra, Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde, Rede Lai Lai Apejo – População Negra e Aids e Rede Nacional de Promoção e Controle Social da Saúde das Lésbicas Negras (Rede Sapatá) e Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras. A parceria é do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
Mapa Mobilização Pró-Saúde População Negra 2010

Maiores informações visite: www.redesaudedapopulacaonegra.org

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Filosofia africana

O adjectivo “africana”, acima mencionado e que qualifica a palavra filosofia, é formado a partir do termo “África” que, segundo alguns estudiosos da linguagem, deriva do Grego “aphriké”, do Berbere “awrigas”, de “afryquah” significando colónia, e do Latim “aprica” significando “exposto ao sol”. Desse último significado da palavra África, ou seja, exposto ao sol, e da inconstância sócio-econômico-política do continente africano, forja-se falaciosamente a ideia de que o povo africano não tem “queda” para filosofia, não tem “cabeça” para abstração, para metafísica. Será isso verdade? Não há nessa opinião um preconceito que remonta a Homero, Aristóteles, Platão e outros? A expressão ”filosofia africana” pode parecer estranha para muitos, no entanto, o povo africano filosofa, tem “cabeça filosófica”.

Senão vejamos: Metafisicamente falando, os africanos possuem palavras e termos que remetem à ideia, a conceitos ontológicos, tais como, em Iorubá (língua africana): “ni” significa ser, “mõ” significa conhecer, ”ofifo” significa o nada. Em Banto (outra língua africana): “ntu” expressa a ideia de ser. A partir do conceito de ser (ntu), a cultura bantu deriva quatro categorias de tudo o que se pode conhecer: 1. “muntu” conceitua o ser-de-inteligência (o ser humano); 2. “kintu” significa o ser-sem-inteligência (as coisas); 3. “hantu” expressa o ser-localizador (lugar-tempo); 4. O ser-modal (modificação do ser). Além dessas quatro categorias, na filosofia africana, especificamente a filosofia bantu, são de suma importância estes conceitos: unificação de lugar e tempo, distinção entre o existir e o viver. Os bantu (etnia africana) chegam à ideia de que lugar e tempo são concomitantes, baseados na localização dos existentes, uma vez que “qualquer existente, assim que surge, supõe necessariamente o antes e o depois”. Ao lado disso, a diferença entre o existir e o viver se faz, na filosofia bantu, da seguinte forma: o existir é abrangente, geral, universal; enquanto que o viver é um momento do existir, é uma particularidade do existir. Convém observar que alguns pensadores africanos entendem que os conceitos filosóficos chegam a eles através da música, da percussão, da religião e da dança.

fonte: Jornal de Angola texto encontrado em http://paginasdefilosofia.blogspot.com/search/label/Filosofia%20Africana

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Caminhada pela liberdade religiosa reúne 120 mil no Rio

Milhares de pessoas participaram neste domingo de uma caminhada na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), em defesa da liberdade religiosa. Segundo a Polícia Militar, 120 mil pessoas compareceram ao evento. Ao som de grupos como Olodum, seis trios elétricos animaram a manifestação, que reuniu praticantes de várias religiões.

Esta foi a terceira edição da caminhada, organizada pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (Ccir) do Rio. De acordo com o interlocutor da instituição, Ivanir dos Santos, o grande destaque foi o aumento da participação de católicos e anglicanos no evento.

O bispo da Igreja Anglicana Celso Franco de Oliveira disse que o número de manifestantes dessa corrente no evento ainda é pequeno diante da quantidade de fiéis no Rio. Mesmo assim, destacou que a participação tem crescido a cada ano. "A Igreja Anglicana acredita que cada um de nós tem uma subjetividade singular e como tal tem o direito de expressar sua fé como quiser. O importante é ser feliz", disse Oliveira.

Da Igreja Católica, um grupo chamou atenção ao lembrar do episódio em que a imagem de uma santa foi depredada durante programa de TV da Igreja Universal do Reino de Deus, em 1995. À época, os líderes religiosos da Igreja pediram desculpas pelo fato. "Trouxemos esses cartazes com a imagem do pastor chutando a santa para que nós, principalmente os católicos, não nos esqueçamos. Queremos liberdade religiosa para todos, independente da crença", disse Juan Santos.

Praticantes de wicca, hare krishnas, mulçumanos e ciganos também marcaram presença na caminhada, mas predominaram as religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé. De acordo com Ivanir dos Santos, eles são as principais vítimas da intolerância. "Não podemos deixar os setores intolerantes crescerem. Há mais de 30 anos, eles perseguem a umbanda e o candomblé. Se crescerem, não tenho dúvidas, chegarão a outros setores da população brasileira. Estamos defendendo a democracia", afirmou.

Além de pedir o fim de atitudes "proselitista", de maneira geral de grupos cristãos, os praticantes de umbanda da Tenda Espírita Cabloco Arranca-Toco, da Ilha do Governador, disseram que a manifestação é uma oportunidade de confraternização. "Na nossa região tem várias igrejas e ninguém tem problema com ninguém", afirmou o representante Antônio Manuel de Oliveira. "Nossa dádiva é unir, conviver, porque Deus é um só, viemos aqui defender essa ideia".

Agência Brasil - Colaborou com esta notícia o internauta José Carlos Pereira de Carvalho, do Rio de Janeiro (RJ), que participou do vc repórter, canal de jornalismo participativo do Terra. Se você também quiser mandar fotos, textos ou vídeos,

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Frantz Fanon: um pensador engajado

Psiquiatra, ensaísta e pensador francês nascido na ilha de Martinica, território francês situado na América Central, Fanon (1925-1961) é um exemplo de intelectual engajado.



Em 1946, inscreve-se na Faculdade de Medicina de Lyon na França e aproveita sua estadia também para adquirir uma formação sólida em filosofia e literatura, seguindo cursos de Jean Lacroix e de Merlau-Ponty, bem como, lendo obras de Sartre, Kierkegaard, Hegel, Marx, Lenin, Husserl e Heidegger, entre outras. Após terminar o curso de medicina em 1951, retorna a Martinica e mais tarde volta para a África, tornando-se médico-chefe na clínica psiquiátrica de Blida-Joinville.
No final da década de 50, vendo as atrocidades cometidas pelo exército francês participa da resistência argelina. Naquela época a Argélia ainda era dominada pela França. Torna-se argelino engajando-se na luta pela libertação do país que sofria o jugo colonial francês desde 1830. Por várias vezes participou de congressos pan-africanos como membro da delegação da Argélia, tornando-se um importante porta-voz do país
Nos seus escritos, Fanon, analisa as consequências psicológicas que a colonização provocada no colonizado, principalmente do ponto de vista da relação branco-negro e o continente africano e europeu.
Seu livro de maior destaque é Os condenados da terra, de 1961, prefaciado por Jean Paul Sartre. Para Fanon, “o mundo colonizado é um mundo cortado em dois. A linha de divisão, a fronteira (entre colonos e colonizados) é indicada pelas casernas e os postos policiais”. Um outro importante livro de Fanon é Pele negra
Fanon pode ser consideado o maior pensador do século XX relacionado aos temas da descolonização e a psicopatologia da colonização. Suas obras foram inspiradas nos movimentos de libertação anti-coloniais por mais de quatro décadas.

Fontes consultadas:
http://www.google.com.br/images
Revista de Filosofia. Editora Escala, Ano II, nº 14.
http://ffabios.sites.uol.com.br/

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Limite das fazendas em até 3 mil campos de futebol assentaria grande parte da população do país que não tem terra

27/08/2010

Raquel Junia

Hoje, no Brasil, mais de 15 mil propriedades rurais possuem mais de dois mil e quinhentos hectares, de acordo com os dados do Censo Agropecuário de 2006, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O mesmo censo mostra que apenas 1% dos imóveis rurais tem área acima de mil hectares, mas ocupam 44% das terras do país. É para tornar esta realidade menos desigual que o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) está organizando um plebiscito popular pelo limite da propriedade da terra no Brasil. Pela proposta do FNRA, as fazendas podem ter no máximo 35 módulos fiscais, que em estados como Amazonas, Mato Grosso, Acre e Roraima significa 3.500 hectares, ou seja, cerca de 3.500 campos de futebol. O plebiscito será realizado de 1º a 7 de setembro em todas as regiões do país.

O Fórum propõe que as terras excedentes para além dos 35 módulos fiscais sejam destinadas à reforma agrária. De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), fazendas com mais de 15 módulos fiscais já são consideradas grandes propriedades. “Com o limite em 35 módulos fiscais, o tamanho da propriedade variará de 175 hectares, próximo aos grandes centros, o que é muito, até 3.500 hectares em áreas mais distantes, como a Amazônia. Não estamos propondo acabar com a grande propriedade, já que esta é acima de 15 módulos fiscais, estamos apenas acabando com as gigantescas. Então, trata-se de reduzir a desigualdade e não acabar com ela”, explica o geógrafo Paulo Alentejano, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e membro da coordenação do plebiscito no Rio de Janeiro.

Terra para todo mundo

Como o módulo fiscal varia de acordo com o município, o limite da propriedade, com a aprovação do plebiscito, também será variável. A estimativa é de que 200 milhões de hectares excedentes poderiam ser destinados para a reforma agrária. Atualmente, não existe um dado exato sobre o número de famílias que demandam viver e trabalhar no campo, entretanto, de acordo com os dados do último Censo Agropecuário (2006), há 4 milhões de famílias camponesas sem-terra trabalhando na zona rural como assalariados, arrendatários e parceiros. Outros balanços dão conta de 200 mil famílias sem-terra acampadas à espera dos assentamentos. “Se você agregar a isso milhões de famílias que foram expulsas do campo e vivem precariamente nas cidades — porque algumas delas podem ter interesse em voltar para a terra —, isso poderia chegar a dez milhões de famílias. E de fato esta medida de limitar as propriedades poderia resolver tranquilamente esta demanda”, diz Paulo Alentejano.

De acordo com o Incra, a média nacional de tamanho dos lotes nos assentamentos da reforma agrária tem sido de 34 hectares, variando de acordo com a região. Com a concretização da proposta do plebiscito, os 200 milhões de hectares excedentes seriam suficientes para assentar a provável demanda de dez milhões de famílias em lotes de até 20 hectares, tamanho que está dentro do módulo fiscal mínimo em vários estados do país. Um módulo fiscal é o tamanho considerado pelo Incra com o mínimo necessário para que uma família possa tirar o seu sustento, nenhum lote destinado a assentamento pode ter menos de um módulo fiscal.

Segundo o FNRA, em outros países a propriedade rural já foi limitada de forma mais radical do que a que está sendo proposta para o Brasil. No Japão, por exemplo, o limite é de 12 hectares; na Coréia do Sul, de apenas três hectares; na Índia, de 21,9 hectares. Na América Latina, os limites no Peru, El Salvador e Nicarágua são de 150 hectares, 500 hectares e 700 hectares, respectivamente. Todas as medidas são menores do que os 3.500 hectares que algumas propriedades poderão continuar tendo no Brasil, mesmo após a limitação em 35 módulos fiscais.

Concentração histórica

A história da concentração de terras no Brasil começou ainda nos tempos de Colônia com a divisão do país em Sesmarias. “Distribuiu-se o controle da terra para poucos amigos do rei, que passaram a ter o direito de explorar a terra, mas também a responsabilidade sobre o controle político do território. É um sistema que articula economia e política, a exploração da terra via exploração do trabalho escravo cada vez mais e também o controle político sobre o território para que outras potências estrangeiras não viessem se apoderar disso”, explica Paulo.

Ele lembra que em 1850 foi promulgada a Lei de Terras, medida que mantém as propriedades nas mãos de poucos e alija grande parte da população do acesso à terra à medida que as propriedades passam a ser vendidas para aqueles que podem pagar. “Mantém-se o monopólio da terra e a concentração dela após a Lei de Terras e ao longo de toda a história do século XX. Agora, no século XXI, as sucessivas tentativas de realizar a reforma agrária no Brasil foram barradas pelo poder político do latifúndio”, observa.

O professor aponta que, a partir da década de 1970, com a modernização da agricultura, ainda mais camponeses foram expulsos do campo e a concentração de terras foi se tornando cada vez maior. Paulo avalia que o latifúndio no país foi tomando feições diferentes ao longo do tempo e que hoje é administrado por grandes empresas capitalistas, muitas vezes, transnacionais, e que combinam modernas técnicas de produção com práticas arcaicas, como o trabalho escravo. “São interesses extremamente poderosos que existem hoje contra qualquer tipo de reforma agrária. E por que isso? Porque mesmo o agronegócio dito altamente produtivo necessita permanentemente de terras novas para sua expansão. Até porque ele desgasta profundamente o solo, e desgastando o solo, precisa de novas terras para se expandir. Caso não haja estoque de terras improdutivas, o agronegócio não tem para onde avançar, e não tem como se recompor, por isso há uma necessidade destes setores, mesmo os ditos mais desenvolvidos da agricultura brasileira, de manterem estoques de terras paradas e situações arcaicas de produção”, analisa.

Menos concentração e mais saúde

Para além da proposta de definição do tamanho máximo de uma propriedade rural, os movimentos sociais reunidos no FNRA também propõe um novo modelo para a produção agrícola, baseado na agroecologia, sem utilização de agrotóxicos e relações de trabalho e do homem com a natureza diferenciadas. " A crítica a esse modelo agrário dominante se rebate na defesa de um outro modelo que embasaria a proposta de reforma agrária, com base na democratização das condições de vida no campo e na rejeição destas características que estão postas com este modelo - violência, superexploração do trabalho e devastação ambiental", define Paulo.

Neste sentido, a proposta do limite da propriedade associada a esta forma diferenciada de trabalho agricola pode possibilitar uma condição de vida mais saudável. Paulo destaca que ao evitar o uso de insumos químicos e se concentrar no uso de insumos orgânicos, a agroecologia deixaria de impactar tanto o solo, a àgua, os trabalhadores e os alimentos como tem feito o agronegócio. "A relação que se mantem com o ambiente é uma relação que busca não impor a lógica produtiva dada a priori às condições ambientais e sim adaptar a produção às condições dadas pelo ambiente, então, é outra relação dada entre sociedade e natureza e homem e natureza que tenta se estabelecer a partir da agroecologia de forma que não se produz tantas transformações sobre o meio ambiente e consequentemente o ambiente também não gera reações sobre as pessoas".

O pesquisador explica ainda que não está em jogo na produção agroecológica a superexploração do trabalho em busca do lucro, mas a qualidade da vida dos próprios trabalhadores que estão no campo.

Participação popular

Para a economista do Instituto de Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs), Sandra Quintela, o plebiscito é uma oportunidade para se exercer a democracia participativa e pressionar para que situações injustas como a concentração de terras no país sejam mudadas. “O plebiscito é um instrumento para questionarmos a democracia representativa, porque ela virou sinônimo de democracia, como se fosse a única forma de a maioria da população entender o que é democracia. Mas democracia não é apenas passar um cheque em branco para uma pessoa que vai legislar ou governar em seu nome: temos que criar mecanismos de participação direta da população sobre assuntos de grande relevância, como é o caso do uso da terra. Este deveria ser de fato um instrumento mais corriqueiro na forma de tomar decisões no Brasil”, avalia.

Sandra lembra que este é o 4º plebiscito realizado no país. O primeiro foi sobre a dívida externa brasileira, em seguida foi realizado o plebiscito sobre a adesão do Brasil à Alca e, posteriormente, sobre a reestatização da companhia Vale. Ela conta que em todos os plebiscitos houve grande participação popular. “Além dos militantes, muita gente que não é de partidos, sindicatos e movimentos sociais, também se envolve na organização do plebiscito porque de fato entende a importância do tema e se encanta com o próprio método de trabalhar, de forma descentralizada, que tem muito mais a ver com um mutirão mesmo de diálogo com a população. Na realidade, é um instrumento pedagógico”, diz.

O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo está incentivando a criação de comitês pelo limite da propriedade da terra em todo país. Em todos os estados deve haver votação. Após a data de realização do plebiscito, os votos serão contabilizados nos estados e depois enviados à Brasília. O plebiscito não tem caráter deliberativo mas a ideia é que dê subsídios para a proposta de realização de um plebiscito oficial. Junto, está sendo organizado um abaixo-assinado a partir do qual se pretende criar um projeto de lei sobre o assunto. Sandra chama atenção para os resultados dos plebiscitos anteriores. “Nós conseguimos barrar a Alca e, no caso brasileiro, conseguimos barrar também a implantação de uma base militar dos Estados Unidos em nosso território. E isso é muito importante. No caso do plebiscito da dívida, conseguimos, dez anos depois, que o Congresso Nacional fizesse uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a dívida, e hoje o Ministério Público Federal está estudando os resultados da CPI. Neste ano realizamos o encontro nacional dos atingidos pela Vale também como desdobramento do plebiscito da Vale. Por isso é muito importante que todos participem”, convida.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Gentileza gera gentileza

A reflexão sobre a gentileza nos leva a pensar sobre a forma como estão se dando as relações entre as pessoas no mundo contemporâneo. Uma das marcas da nossa sociedade tem sido a degradação das relações entre as pessoas nas famílias, nas escolas, nas empresas, no trânsito, com o meio-ambiente e em outros espaços. É com este pano de fundo que trataremos da questão da gentileza.

Primeiro é preciso entender a gentileza como uma qualidade de ser gentil. A palavra gentil, do latim gentile, indica a nobreza e a generosidade que deve predominar no trato com os outros no nosso dia-a-dia e, portanto, vista como uma condição de ser e estar-no-mundo.

A gentileza é uma característica relacionada com caráter, valores e ética. Tratamos a gentileza no campo da ética e, mais especificamente, como uma virtude. Virtude, em sentido ético, é uma qualidade do indivíduo que faz com que este haja de forma a fazer o bem para si e para outros. Deste modo, para se tornar uma pessoa gentil é preciso que cada um reflita sobre o modo como vem se relacionando consigo mesmo, com as outras pessoas, com o mundo e com a natureza.

Devemos ver a gentileza como algo mais sofisticado e profundo do quer ser educado, ou do mero cumprimento das regras de etiqueta, embora devemos ser sempre educados. Enquanto uma virtude podemos também entendemos a gentileza como disposição para o bem. Assim, qual o bem que quero para mim mesmo e para os outros?

A gentileza é uma lente através da qual podemos ver o mundo e uma forma de nos situarmos neste mundo, assim, precisamos pensar no como está a nossa relação como os outros. Neste sentido, você cumprimenta sempre os outros, pede desculpas, reconhece os seus erros, respeita as pessoas, é solidário e companheiro, sabe escutar, pensa positivamente e procura se colocar no lugar do outro? Pensemos no quanto a prática da gentileza, do ser gentil, pode abrir as portas, mudar o rumo dos conflitos, facilitar negociações, transformar humores, melhorar as relações, trazendo muitas vantagens tanto na vida de quem é gentil quanto na de quem recebe gentilezas.

Mais concretamente vejamos o caso da empresas, que hoje têm contratado profissionais que sabem solucionar problemas e favorecer as conciliações, portanto, muito mais que a competência técnica, recebida nas escolas e nas universidades, as habilidades humanas como a gentileza, ainda escassas entre nós, é muito bem quista e procurada na atualidade.

Platão considerava a virtude como uma qualidade que o indivíduo trazia consigo e que, portanto, não podia ser ensinada. Já Aristóteles, afirmava que a virtude podia ser adquirida, pois era na realidade o resultado de um hábito. Hábito que se configura como uma disposição prática, duradoura e constante de uma ação, de um ato. Seguindo esta perspectiva de pensamento, entendemos que a gentileza tão necessária no mundo contemporâneo, é algo que podemos e devemos adquirir via o processo educativo. A aquisição e a prática da gentileza com algo cotidiano contribuirá para a humanização e facilitará as nossas relações nas famílias, nas escolas, nas igrejas e no trabalho.

Em tempos de questões ambientais, o que a gentileza, ao não jogar o papel de bala no chão, o manejo racional das florestas e recursos minerais, a não poluição das águas, o uso de energia limpa e tantas outras ações gentis, nobres e generosas para com o nosso planeta, contribuirá para uma maior responsabilidade para com as gerações do presente e as futuras.

Por fim, todos nós clamamos por um mundo melhor, por qualidade de vida e pelo desenvolvimento sustentável, em suma, por uma vida feliz. Mas como chegar ao que desejamos e queremos sem termos a gentileza como um critério e uma qualidade necessária para o nosso bem e o bem de todos. Imaginemos qual seria o ranking das nações se a gentileza, e não apenas os critérios econômicos e sociais fosse tomada como um dos critérios para a avaliação do índice de desenvolvimento humano?

João Carlos Pio de Souza

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Censo 2010 - Não deixe sua cor passar em branco

CARTA ABERTA DA ABPN À SOCIEDADE BRASILEIRA‏

A Assembléia do VI Congresso Brasileiro de Pesquisadores (as) Negros(as), no dia 29 de julho de 2010, na cidade do Rio de Janeiro, vem a público apresentar o seu posicionamento em relação às ações sociais e institucionais para o fortalecimento dos direitos da população negra, a saber:

1 – Investir e construir politicamente 2011 - Ano Internacional das/os Afro descendentes, instituídos pela Assembléia Geral das Nações Unidas, nos marcos dos 10 anos da Conferencia de Durban, para consolidar o intercâmbio e laços entre afrodescendentes da diáspora e africanas/os, na continuidade da luta pela construção de sociedades sem racimo, sexismo e dominação de classe.

2 – Reafirmar as diretrizes da Plataforma Brasil sem Racismo, a partir da qual:

- cobramos posicionamento dos/as presidenciáveis de 2010 acerca das propostas que garantam o fortalecimento dos direitos da população negra;

- cobramos a manutenção de um órgão executivo federal com plena capacidade financeira e técnica para articulação e deliberar políticas de promoção da igualdade racial;

- cobramos a participação equitativa de mulheres e homens negros nos espaços de articulação e decisão, como forma de implantação e implementação de Política de Ação Afirmativa em todos os ministérios, prioritariamente, nos Ministérios da Saúde, Educação, Cultura, Cidade, Reforma Agrária, Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Defesa e na Casa Civil;

3 – Que a SEPPIR garanta a divulgação da importância do censo de 2010 para a população negra;

4 – À luz da conjuntura atual e da releitura política do Estatuto da Igualdade Racial, afirmamos que a retirada de concepções que embasam a resistência histórica de mulheres e homens negros, tais como a construção sociológica do conceito de raça; a escravidão como crime contra a humanidade, ratificado pelo Estado Brasileiro na Declaração e Programa de Ação de Durban; o racismo como instrumento de poder que determina as condições desiguais para a população negra; bem como o impedimento do reconhecimento do dever do Estado e da Sociedade Brasileira em implementar políticas publicas, à exemplo de cotas que garantam os direitos de cidadania plena de mulheres e homens negros nos bens e riqueza coletivamente construídos, a retirada é de inteira responsabilidade das forças conservadores representadas pelo DEM; e que os avanços ali contidos são fruto da luta histórica do movimento negro.

Conclamamos a sociedade a firmar um pacto pela desconstrução do racismo e que se manifeste favoravelmente pela aprovação do Projeto de Lei de Cotas, que garante acesso e permanência da juventude negra no ensino superior, dentre outras medidas de política de igualdade racial.

A nossa resistência vem dos saberes e dos poderes de nossos ancestrais e guerreiras que nos dão a vida, da força das nossas/os yalorixas e babalorixas, da juventude que reinventa caminhos de inclusão; de mulheres e homens negros desde sempre resistindo e se afirmando, de pesquisadores (as) negras (os) que se tornam os “rebeldes do saber” para garantir e recriar o legado da afrodiáspora.

Associação Brasileira de Pesquisadores Negros – ABPN
http://www.abpn.org.br/

terça-feira, 20 de julho de 2010

Pan-Africanismo: ferramenta ideológica no processo de Independência da África

Não podemos falar em independência sem levar em conta o papel que a ideologia joga neste contexto. Assim, como não poderia deixar de ser como o Pan-Africanismo, que contribui no campo da idéias para a construção de uma visão de mundo, que auxiliou ideologicamente os povos africanos em sua luta e conquista de liberdade.

Assim, as primeiras inquietações de Edward W. Blyden quanto ao seu lugar no mundo, na sociedade contemporânea, acabaram contribuindo para o desencadeamento do processo de valorização do modo de ser, sentir e viver da comunidade africana, em todos os cantos do mundo.

O Pan-Africanismo mais que uma idéia foi e ainda é um sentimento, que busca valorizar e colocar os elementos culturais de matriz africana, em seu devido lugar, no campo do pensamento libertário. Visto que, surge e se desenvolve em resposta ao processo de exploração neocolonial desenvolvido pelas grandes potências industriais no transcorrer do século XIX.

Em seu nascedouro o movimento pode ter cometido excessos e entrado em contradições, que deram oportunidade aos opositores da idéia de liberdade do povo africano, notadamente, aqueles identificados com os ideais da Conferência de Berlim; a oportunidade de desqualificar o Pan-Africanismo, como sendo uma resposta à descriminação racial de cunho racista. Tal atitude está relacionada à ação inicial do grupo que ficou conhecido como negritude, cuja militância radical é questionada por defender princípios separatistas inclusive a idéia de construção de uma "África para os africanos".

Apesar da idas e vindas do movimento de restauração da dignidade africana e de sua luta em defesa da emancipação política não ter significado a solução de problemas sociais e econômicos, que afetam a maioria das populações em todo o continente; cujas seqüelas estão estampadas em todos os meios de comunicação em nossos dias, desafinado a comunidade mundial a resolver os problemas criados pela dominação colonial e neocolonial, que continuam atingindo a dignidade de milhões de seres humanos.

É principalmente, por esta razão, o espaço para o debate e a divulgação das idéias de um Pan-Africanismo antenado em seu tempo. Mas, sem deixar de levar e perceber o contexto histórico em que vivemos. Um mundo em profundo processo de transformações.

Neste sentido, as ferramentas de comunicação de massa ocupam um espaço positivo transformando o advento da comunicação em rede em um instrumento valioso para a transformação do ser e de sua coletividade.

Texto de: Hércules Azevedo da Silva

O real e o imaginário da geopolítica do continente africano

A África tem sido palco dos interesses das potências ocidentais há muito tempo. Isso não ocorre apenas por suas riquezas naturais, visto que seu subsolo é mais conhecido pelos colonizadores do que pelos próprios nativos, mas também pelo seu posicionamento geográfico estratégico. Tal interesse pela geopolítica africana começa muito antes da partilha da África. É importante observar que toda a cartografia produzida a partir do século XVI utilizava o recurso de ampliação do continente Europeu, colocando-o em relação aos demais continentes como superior. Essa técnica, psicologicamente, supervalorizava sua importância. Dessa suposta superioridade, em 1885, na Conferência de Berlim, a Europa se propõe resolver os conflitos de fronteiras existentes na África para sacralizar a partilha deste continente e definir sua política de colonização, pois atestavam que os povos desse continente eram incapazes de se organizar politicamente.

Todos sabemos, no entanto, que as fronteiras do mundo não são naturais e sim artificiais. Elas são definidas pelo processo histórico, neste sentido, podemos defender que as fronteiras nunca foram, nem nunca serão estáticas na África ou em qualquer outro continente. “Os Grandes Impérios africanos nos mostram que as formações dos Estados foram sempre acompanhadas pelas movimentações de fronteiras”.
Portanto, a partilha trouxe uma nova geopolítica. Geopolítica esta que criou diversos problemas quanto ao esfacelamento das identidades étnicas no limite dos países, que antes não existiam e passaram a existir com a Conferência de Berlim. Dessas fronteiras definidas pela Conferência nasceram os Estados Africanos Modernos, que no limite, não favoreceram a criação das identidades nacionais. Podemos dizer que as potências européias foram as que mais se beneficiaram com essas fronteiras artificiais, pois estas causavam conflitos tribais que enfraqueciam o poder dos nativos frente à colonização.

Torna-se importante observar que o conceito de tribo é utilizado para atestar através do imaginário, que esses povos não tinham – e ainda hoje não têm – a capacidade de se auto-governar. Essas novas identidades nacionais se erguiam em detrimento das identidades étnicas dos povos africanos. Os colonizadores reduziram Impérios inteiros à condição de tribos. Criaram, até mesmo, etnias que nunca existiram para mostrarem ao mundo que as brigas interétnicas postulavam a impossibilidade de uma auto-governabilidade.

Por exemplo, no conflito localizado em Ruanda e Burundi, onde morreram mais de 1 milhão de pessoas – em menos de um ano –, podemos notar que o que foi apresentado ao mundo pelos meios de comunicação, determinava que nesta região ocorria uma guerra tribal. Entretanto, não existiam etnias diferentes e sim, uma sociedade que poderíamos dizer que estava dividida em castas. Podemos definir assim porque o que foi denominado pelos belgas como 3 etnias diferentes (Tutsis, Hutus, Bantus), seria apenas uma sociedade com a mesma cultura, política (Monarquia) e religião.

Neste sentido, imaginar que essas três etnias distintas, que viviam na visão dos belgas, em sistemas de cultura, política e religião diferentes, foram assim definidas para sustentar a hipótese de que os povos africanos passavam por constantes conflitos tribais é de grande relevância política. Na visão de Munanga, esta análise é revestida de uma ideologia colonizadora. Os conflitos nas regiões destes dois países africanos pode ser analisada, simplesmente, como uma guerra civil, que tem por finalidade definir a tomada de poder por uma classe.

Mostrar que esses conflitos no continente africano são definidos como guerras civis e que pretendem delimitar o poder no Estado Nacional é uma forma de lutar contra essa lógica colonizadora. Além disso, a maioria das guerras em África acontece no interior de cada estado e, por isso, não são fronteiriças. As guerras de fronteiras são poucas. Para Kabengele, os europeus manipulavam e ainda manipulam a etnicidade e neste momento não tem conhecimento de nenhum país que viva em conflitos étnicos para definição de fronteiras.

Para exemplificar ainda mais a realidade da geopolítica africana, o prof. Kabengele diz que em seu país de origem, a República Democrática do Congo (antigo Zaire), na época da Guerra Fria, recebeu apoio incondicional dos EUA e da França devido sua posição geográfica. Os americanos e franceses poderiam observar ou, em caso de conflito, atingir qualquer um dos nove países que fazem fronteiras com o Congo na África. Até mesmo os países africanos com regimes fascistas e antidemocráticos, receberam apoio de potências como EUA e França por que havia interesses políticos com a geopolítica desses países.

A África não tem utilidade simples e pura pelos seus recursos naturais, a sua posição geopolítica é muito importante.

Diego da Costa Vitorino (Pesquisador do NUPE – Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara) Resenha elaborada a partir da palestra “A África frente às Duras Realidades da Geopolítica Internacional” do Prof.Dr. Kabengele Munanga na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo no dia 26 de maio de 2004. (22/07/2004)