terça-feira, 20 de julho de 2010

Pan-Africanismo: ferramenta ideológica no processo de Independência da África

Não podemos falar em independência sem levar em conta o papel que a ideologia joga neste contexto. Assim, como não poderia deixar de ser como o Pan-Africanismo, que contribui no campo da idéias para a construção de uma visão de mundo, que auxiliou ideologicamente os povos africanos em sua luta e conquista de liberdade.

Assim, as primeiras inquietações de Edward W. Blyden quanto ao seu lugar no mundo, na sociedade contemporânea, acabaram contribuindo para o desencadeamento do processo de valorização do modo de ser, sentir e viver da comunidade africana, em todos os cantos do mundo.

O Pan-Africanismo mais que uma idéia foi e ainda é um sentimento, que busca valorizar e colocar os elementos culturais de matriz africana, em seu devido lugar, no campo do pensamento libertário. Visto que, surge e se desenvolve em resposta ao processo de exploração neocolonial desenvolvido pelas grandes potências industriais no transcorrer do século XIX.

Em seu nascedouro o movimento pode ter cometido excessos e entrado em contradições, que deram oportunidade aos opositores da idéia de liberdade do povo africano, notadamente, aqueles identificados com os ideais da Conferência de Berlim; a oportunidade de desqualificar o Pan-Africanismo, como sendo uma resposta à descriminação racial de cunho racista. Tal atitude está relacionada à ação inicial do grupo que ficou conhecido como negritude, cuja militância radical é questionada por defender princípios separatistas inclusive a idéia de construção de uma "África para os africanos".

Apesar da idas e vindas do movimento de restauração da dignidade africana e de sua luta em defesa da emancipação política não ter significado a solução de problemas sociais e econômicos, que afetam a maioria das populações em todo o continente; cujas seqüelas estão estampadas em todos os meios de comunicação em nossos dias, desafinado a comunidade mundial a resolver os problemas criados pela dominação colonial e neocolonial, que continuam atingindo a dignidade de milhões de seres humanos.

É principalmente, por esta razão, o espaço para o debate e a divulgação das idéias de um Pan-Africanismo antenado em seu tempo. Mas, sem deixar de levar e perceber o contexto histórico em que vivemos. Um mundo em profundo processo de transformações.

Neste sentido, as ferramentas de comunicação de massa ocupam um espaço positivo transformando o advento da comunicação em rede em um instrumento valioso para a transformação do ser e de sua coletividade.

Texto de: Hércules Azevedo da Silva

O real e o imaginário da geopolítica do continente africano

A África tem sido palco dos interesses das potências ocidentais há muito tempo. Isso não ocorre apenas por suas riquezas naturais, visto que seu subsolo é mais conhecido pelos colonizadores do que pelos próprios nativos, mas também pelo seu posicionamento geográfico estratégico. Tal interesse pela geopolítica africana começa muito antes da partilha da África. É importante observar que toda a cartografia produzida a partir do século XVI utilizava o recurso de ampliação do continente Europeu, colocando-o em relação aos demais continentes como superior. Essa técnica, psicologicamente, supervalorizava sua importância. Dessa suposta superioridade, em 1885, na Conferência de Berlim, a Europa se propõe resolver os conflitos de fronteiras existentes na África para sacralizar a partilha deste continente e definir sua política de colonização, pois atestavam que os povos desse continente eram incapazes de se organizar politicamente.

Todos sabemos, no entanto, que as fronteiras do mundo não são naturais e sim artificiais. Elas são definidas pelo processo histórico, neste sentido, podemos defender que as fronteiras nunca foram, nem nunca serão estáticas na África ou em qualquer outro continente. “Os Grandes Impérios africanos nos mostram que as formações dos Estados foram sempre acompanhadas pelas movimentações de fronteiras”.
Portanto, a partilha trouxe uma nova geopolítica. Geopolítica esta que criou diversos problemas quanto ao esfacelamento das identidades étnicas no limite dos países, que antes não existiam e passaram a existir com a Conferência de Berlim. Dessas fronteiras definidas pela Conferência nasceram os Estados Africanos Modernos, que no limite, não favoreceram a criação das identidades nacionais. Podemos dizer que as potências européias foram as que mais se beneficiaram com essas fronteiras artificiais, pois estas causavam conflitos tribais que enfraqueciam o poder dos nativos frente à colonização.

Torna-se importante observar que o conceito de tribo é utilizado para atestar através do imaginário, que esses povos não tinham – e ainda hoje não têm – a capacidade de se auto-governar. Essas novas identidades nacionais se erguiam em detrimento das identidades étnicas dos povos africanos. Os colonizadores reduziram Impérios inteiros à condição de tribos. Criaram, até mesmo, etnias que nunca existiram para mostrarem ao mundo que as brigas interétnicas postulavam a impossibilidade de uma auto-governabilidade.

Por exemplo, no conflito localizado em Ruanda e Burundi, onde morreram mais de 1 milhão de pessoas – em menos de um ano –, podemos notar que o que foi apresentado ao mundo pelos meios de comunicação, determinava que nesta região ocorria uma guerra tribal. Entretanto, não existiam etnias diferentes e sim, uma sociedade que poderíamos dizer que estava dividida em castas. Podemos definir assim porque o que foi denominado pelos belgas como 3 etnias diferentes (Tutsis, Hutus, Bantus), seria apenas uma sociedade com a mesma cultura, política (Monarquia) e religião.

Neste sentido, imaginar que essas três etnias distintas, que viviam na visão dos belgas, em sistemas de cultura, política e religião diferentes, foram assim definidas para sustentar a hipótese de que os povos africanos passavam por constantes conflitos tribais é de grande relevância política. Na visão de Munanga, esta análise é revestida de uma ideologia colonizadora. Os conflitos nas regiões destes dois países africanos pode ser analisada, simplesmente, como uma guerra civil, que tem por finalidade definir a tomada de poder por uma classe.

Mostrar que esses conflitos no continente africano são definidos como guerras civis e que pretendem delimitar o poder no Estado Nacional é uma forma de lutar contra essa lógica colonizadora. Além disso, a maioria das guerras em África acontece no interior de cada estado e, por isso, não são fronteiriças. As guerras de fronteiras são poucas. Para Kabengele, os europeus manipulavam e ainda manipulam a etnicidade e neste momento não tem conhecimento de nenhum país que viva em conflitos étnicos para definição de fronteiras.

Para exemplificar ainda mais a realidade da geopolítica africana, o prof. Kabengele diz que em seu país de origem, a República Democrática do Congo (antigo Zaire), na época da Guerra Fria, recebeu apoio incondicional dos EUA e da França devido sua posição geográfica. Os americanos e franceses poderiam observar ou, em caso de conflito, atingir qualquer um dos nove países que fazem fronteiras com o Congo na África. Até mesmo os países africanos com regimes fascistas e antidemocráticos, receberam apoio de potências como EUA e França por que havia interesses políticos com a geopolítica desses países.

A África não tem utilidade simples e pura pelos seus recursos naturais, a sua posição geopolítica é muito importante.

Diego da Costa Vitorino (Pesquisador do NUPE – Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara) Resenha elaborada a partir da palestra “A África frente às Duras Realidades da Geopolítica Internacional” do Prof.Dr. Kabengele Munanga na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo no dia 26 de maio de 2004. (22/07/2004)